segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Como é que eu deixei?


Era Sábado à noite. Um como tantos outros com excepção de que estávamos em casa a ver um filme já mil vezes visto.
A conversa era leve, sorriamos amigavelmente e tecíamos comentários sobre o enredo, os diálogos ou as actrizes.
Aquela amizade fácil, aquele à vontade que não se paga.
Olho para ela, olho para o filme a terminar e digo qualquer coisa irrelevante sobre a voz mais que sexy do Joaquim de Almeida.

Volto a olhar para ela, ela está aos bocados ou melhor, a tentar agarra-los para eles não se partirem pelo chão fora fazendo um barulho infinito aos vizinhos. Desmanchou-se ali sem eu poder fazer nada para impedir, quando era essa a minha função, era para isso que eu ali estava.
As lágrimas caíam com força sem eu ter tempo para as conter, e quando lhe pergunto o que é que aconteceu no último minuto ela só me responde “Não aguento, sabes. Há alturas em que não aguento as saudades”. Tento em vão estancar aquilo que sai mas, quantos mais panos ponho, mais encharcados eles ficam. Ajudo-a a segurar os bocados e dou-lhe o telemóvel para a mão quando sei que não devia. Sinto-me a passar um grama de coca para a mão de um drogado, mas assim ela acalmará finalmente. É que eu também já não consigo vê-la assim.

Pergunto-me interiormente quando é que isto vai passar? De onde é que nasceu tanta coisa de onde um dia foi vazio? Como é que ela consegue fingir todos os dias que não sente nada, até para mim, que não percebi que aquilo estava a vir. Levo-a para a cama e obrigo-a a deitar-se e a dormir. Sei que amanha vai estar tudo (aparentemente) bem, sei que um dia vai ficar tudo bem, mas agora? Agora agarra-se às pernas e chora tão alto que parece que lhe estão a queimar o coração com um ferro em brasa, e eu que não vi nada disto a chegar!
Como é que eu a deixei chegar aqui? Logo a ela...

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