Sempre achei que as pessoas para serem muito bem sucedidas tinha de ter alguma coisa especial. Uma aptidão natural para fazer alguma coisa muito bem, tipo uma selecção natural que não se controla, uns tem e outros não.Este pensamento trazia-me frequentemente um problema, é que... eu para além de não ser especialmente boa em qualquer coisa, não tinha também persistência ou força de vontade para fazer acontecer. Logo, por esta linha de raciocínio eu nunca seria excepcionalmente bem sucedida...e isso chateava-me.
Com o tempo várias coisas mudaram. Primeira e mais importante foi a necessidade de ser bem sucedida. Colocar isso como barómetro para a minha felicidade, como se isso fosse essencial. Ser a melhor, a maior, a mais forte, a mais estudiosa, com as melhores notas, perfeita. Acabei com isso já há uns largos tempos. Descobri o simples que é assumirmo-nos como somos. Por vezes fantásticos, outras nem tanto, com este ou aquele defeito, humanos no fundo, normais, iguais. Foi libertador. Eu sou assim, fica quem quer, quem não quer vá andando e na minha parte mais profissional também fiz o mesmo. A verdade, eu nunca vou ser a melhor aluna, eu nunca vou ter a melhor nota, eu nunca vou calar e dizer que sim a tudo, nunca me vou rir senão tiver vontade, nem dizer coisas a pensar que é para agradar. Não sou eu, não me lembro, não tenho paciência e no fundo quando a moeda vai ao ar, eu sei sempre que há coisas mais importantes e quais são as prioridades. Com isto aprendi 1) a aceitar-me assim, 2) a lutar constantemente contra a preguiça, 3) a obrigar-me a ter objectivos e a tentar cumpri-los porque sem eles não chegamos a lado nenhum.
A segunda coisa que descobri, veio por uma frase que a V. me disse há anos atrás quando eu me queixava que qualquer coisa era uma seca, e que não tinha paciência e bla bla bla. Ela olhou para mim e disse-me "porque é que não aprendes?"...nem percebi bem aquilo, mas o raciocínio era simples. Não desaproveitar o tempo, nada é seca se se estiver a aprender. Como os outros trabalham, o que dizem, como fazem, porque são eles bons, como é que chegaram onde chegaram, que livros é que leram, onde aprenderam o que sabem e de quem, porque é que fazem o que fazem, onde é que isso se encaixa na big picture, porque é que nos pedem determinadas coisas, onde podemos encontrar respostas? Sendo que a minha amiga V. é das pessoas que eu considero mais bem sucedida na vida (a todos os níveis), este pensamento dela com o tempo foi fazendo cada vez mais sentido. E o que tenho aprendido a observar os outros foi: é preciso saber o nosso lugar e sermos humildes, saber ouvir, fazer as coisas com atenção, não falar demais, pensar rápido e falar lento, ler e reler o que se escreve seja para quem for, estar sempre bem apresentada, não dar demasiada confiança, não deixar que os outros digam coisas que não estão correctas, dizer sempre a verdade, apresentar problemas com soluções, não dizer mal dos outros nem apontar detalhes que não são da nossa conta, não deixar que abusem de nós, estar disponível para as coisas correctas mas com limites.
Com estas estas duas mudanças de postura, não é que agora seja muito bem sucedida na vida, a bem da verdade de acordo com o designado "normal" não sou. Senão vejamos, sou meio gordinha, nunca vou ser magra na vida (gosto demasiado de comer porcarias para isso), tenho relacionamentos, ou o que quiserem chamar, falhados para coleccionar e trocar com quem quiser, tendencialmente gosto de pessoas que não gostam de mim (ainda não identifiquei bem o meu problema aqui, mas espero um dia chegar lá), estou sozinha há demasiado tempo e não há perspectivas de ter um namorado príncipe encantado, casar, ter uma vida perfeita, bebés e coisas do género, gosto do meu trabalho e vou na maioria dos dias trabalhar a rir-me e bem disposta, mas há alturas em que só me apetece vir embora e que fico entediada de morte, não vivo numa grande casa (mas pago-a sozinha), não tenho muito dinheiro estou constantemente a conta-lo até ao final do mês, não sou filha de pais ricos, não sou propriamente dotada para línguas (apesar de achar que sim), gosto de estudar mas também não sou a melhor, faço judo mas não sei se um dia chego a cinto preto e estou sempre a apanhar, corro mas ainda não consigo fazer 4km em 20minutos como quero, surfo mas ainda mais espumas que ondas, tenho piada e sou divertida mas há alturas em que não gosto de pessoas, nem de estar com pessoas, tenho mau feito e problemas em confiar nos outros, não tenho novas tecnologias caríssimas (o meu computador é de 2004!) ...e podia continuar.
Portanto não, eu não sou bem sucedida na vida, mas de alguma maneira estranha, até gosto do que vejo, do que sou, de onde vim, onde cheguei, para onde quero ir, do meus objectivos. Sinto-me feliz todos os dias com pequenas coisas (hoje foi com o vir a cantar o "Paixão" dos heróis do mar de janela aberta ao final do dia), sinto-me alegre apesar de ser louca e pouco perfeita. Mas acho que é no aprender que chegamos lá, à felicidade, aquela que todos procuram e querem ter...é no aceitarmos-nos e no aprendermos sempre mais e mais coisas.