domingo, 2 de abril de 2023

Coisas de mãe


Não tinha uma conversa assim com a minha mãe há mais de 10 anos. A verdade é mesmo essa, anos de resolver problemas, de irritação, de ódio (sim, ódio), de preocupação e de achar que já não tinha mais direito a trata-la como minha mãe, se na verdade para todos os propósitos, eu é que sou a mãe.

Tantos anos que me esqueci de quão fácil é. Deixei as palavras saírem de mim em catadupa, soltei-as porque já não aguentava mais. Estas ultimas semanas tem sido free-fall, dark and twist all over again, e precisava simplesmente de me ouvir, precisava de ser sincera comigo mesma e parar de me dizer para não sentir, que ia passar, ou para aguentar mais. E achei que ela, acima de qualquer outra pessoa me ia perceber... 

E ela ouviu-me. Com surpresa, com choque da rawness que saiu de cá de dentro como antigamente. Tanto como antigamente! Quando marchava pelas escadas acima direita ao meu quarto pronta a levar tudo à minha frente. 

E depois desse dia, todos os dias ela liga a perguntar como estou. E eles dizem que ela se esquece de tudo e que esta cada vez menos cá. Não comigo! Ontem ligou-me e voltou a falar do choque, das força as minhas palavras. Fez-me rir quando me disse "já deitaste a casa abaixo não?! Bruta, como só tu sabes ser!". E era. E fui durante anos tão bruta e com o coração tão na boca...mas há anos que não. Há anos que não vejo essa parte de mim, que não sei para onde é que ela foi. E então expliquei-lhe isso também; Que engoli a bruta que há em mim há anos atrás com medo de morrer sozinha numa ilha deserta (como ela me disse tantas e tantas vezes). Expliquei-lhe do quadrado, da forma apertada em que me meti, e do que achei que tinha de fazer, que tinha de ser feito...omiti apenas que o fiz para me afastar dela. Para ser o mais diferente dela que pudesse ser. Não a queria magoar. Nunca mais a quero magoar.

E no final ela disse-me que me amava, mesmo que eu fosse bruta ou fizesse as coisas mais impensáveis. Para lhe ligar a contar, que ela me iria amar na mesma! Sem uma pinga de julgamento, sem medo na voz, só mesmo a minha mãe.  

Das vezes que me perguntei como é que ela ainda está viva ou porquê? Qual o objectivo quando daqui para a frente só piora...foi para isto. Nem que seja para isto. Para voltar a ser minha mãe nem que seja só por esta ultima vez. Já valeu a pena. Já valeu tudo a pena. 

Sem comentários:

Enviar um comentário