terça-feira, 12 de julho de 2011

62 anos



Se o meu avô fosse vivo, os meus avós faziam hoje 62 anos de casados. 62 anos é mais do que eu consigo compreender, vai para além de tudo o que é suportável quando a perda chega e por isso sei que a minha avó é das mulheres mais fortes que conheço. Como é que se sobrevive a uma perda dessas?!

62 anos a acordar e a adormecer ao lado da mesma pessoa. 62 anos de partilha, de alegrias, de tristeza. 62 anos a discutir e a fazer as pazes, a achar que desta é que é para sempre que acabou porque me magoaste brutalmente para depois perceber que o amor e o carinho é mais forte que tudo, e que a dor passa e o resto fica. 62 anos que viram filhos e netos, que passaram uma revolução, que perderam tudo e voltaram a reconstruir. 62 anos que conheceram o mundo, que atravessaram a muralha da China e o muro de Berlim vezes sem conta. 62 anos que fizeram esquecer que havia uma vida antes daquela pessoa existir na nossa vida, que apagaram a memoria do eu, ser individual sozinho, porque esse nunca existiu, sempre houve apenas um nós. 62 anos e no ano em que o meu avô morreu, numa das nossas infinitas conversas depois de jantar, ele diz-me com um brilho nos olhos "a tua avó é uma grande mulher" e havia amor. É uma imensidão de sentimentos a perder de vista, e neste momento é para mim uma magia intocável.


Das muitas lições que a minha avó me deu sobre o casamento, e lembro-me de algumas como por exemplo: I) nunca te deites chateada (esta ouvi pela boca do padre no casamento do D.); II) nunca saias de tua casa para ires atrás do teu marido; III) nunca procures pela traição; IV) nunca percas a tua independência; V) nunca gostas mais dele do que ele de ti; etc etc, não sei se ela sempre as seguiu e se foi isso que levaria no dia de hoje aos 62 anos. Não sei sequer se os meus avós sabem como o fizeram, os defeitos, a vida, o afastamento natural, a falta de comunicação, tanta coisa que pode correr mal, tanta hipótese de falhar e só sabemos no final se conseguimos...não dá para prever.


A única coisa que eu posso dizer com certeza é que se o meu avô fosse vivo, eles continuariam casados, a embirrarem por parvoíces e a fazerem as pazes em seguida. Adaptados, unidos, como um só...são os avós, uma entidade única, inseparável, indivisível.

Eu gostava, gostava de um para sempre destes para mim, de um nós único. Infelizmente nunca me senti tão longe de sequer pensar nisso como me sinto agora, mesmo quando a minha cabeça divaga, eu noto logo que aquela ideia não devia estar ali. O que é que eu posso dizer? Se cavarmos bem lá para o fundo era só isso (e eu sou uma romântica!), uma pessoa para partilhar a vida, nos bons e nos maus momentos, uma mesa com comida, 3/5 filhos, uns quantos cães...parece fácil. Altamente improvável e impossível é o que me parece visto daqui.

Mas 62 anos...é uma vida inteira...

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